terça-feira, março 27, 2007

O encontro.


Algumas coisas ela não entendia, o silêncio era uma delas, tão acostumada a expressar suas idéias...Pensava nisso enquanto olhava pela janela do ônibus. Observava a rua, as pessoas, os prédios e como afinal de contas a cidade estava visualmente menos poluída.

Decidiu relevar, acreditar que o corre-corre cotidiano era o responsável pela ausência de respostas. Chegou seu ponto, deu sinal e desceu. A Lua estava linda, um filete dela quase Nova. Gostava de admirá-la e lembrou-se de quando tinha tempo para fazê-lo. Há anos não se preocupava apenas consigo. As responsabilidades cotidianas a impediam disso.

O dia tinha sido quente, atribulado, queria apenas um banho relaxante e deitar. Com sorte conseguiria descansar antes da meia-noite. Torcia por isso.

Caminhava até sua casa com passos lentos de quem volta do trabalho. Nem percebeu o estranho se aproximando, quando deu por ele já tinha sido abordada :

_ Passa a grana, dona! Anda!!

_ "PQP", era só o que me faltava...

_ Cala a boca e "passa" logo, vai!

Ela olhou bem dentro dos olhos do assaltante. Eram familiares...

_ Olha "prá" baixo!! Hei!! A senhora não foi minha professora?

_ "Cara", não é que fui mesmo!! Nossa, quanta coincidência...Está tudo bem com você?

_ "Prá" senhora "vê", a vida "tá" difícil. "Cassete", gostava da sua aula. Não, o celular pode ficar...é velho esse...

_ O que você quer levar então? Me conta, continuou estudando?

_ "Sacumé" tive de parar... Daí virei ladrão, se "pã" dá mais dinheiro do que professora, "tá ligada"?

_ "Porra", se "tou", qualquer coisa dá mais "grana".Enfim, só tenho dez "paus"...Vai levar?

_ "Magina"...Se soubesse que era a senhora nem tinha falado nada, vai em paz. E se cuida, hoje em dia "tá" tudo perigoso...

_ Está bem, obrigada! Mas veja se volta a estudar, era tão bom aluno, inteligente, questionador...Boa sorte para você!

_ "Valeu", dona!

Ele disse isso e sumiu entre os carros. Ela ainda ficou uns minutos parada, atônita. Pensando no que tinha acabado de acontecer. Respirou profundamente e continuou a andar tentando se recompor do susto. Vasculhou a bolsa e achou um último cigarro. Acendeu-o, deu uma longa tragada e refletiu na ironia da situação e em como as condições objetivas destroem potencialidades. Olhou seu cigarro e avaliou como seria possível parar de fumar numa cidade como São Paulo!!

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