segunda-feira, janeiro 22, 2007

Saudade


Andava a esmo deixando a hora passar. Fazia muito frio e sabia que não aguentaria andar por mais tempo. Lembrou-se de um café alí perto, seria o refúgio perfeito. Virou à direita, segunda esquerda e lá estava. Entrou apressado esfregando as mãos por cima das luvas, mas por tempo suficiente para observar o local.

Decoração confortável e aconchegante, mesas ocupadas, burburinho de final de tarde. Café comum para as pessoas das redondezas. Rostos desconhecidos. Ele precisava se aquecer. Sentia saudade de casa e vontade de conversar em português. Pediu, no balcão mesmo, um chocolate quente.

A bebida veio fumegante e seu primeiro gole foi suficiente para lembrar do calor de onde viera. Não, não podia pensar muito nisso, afinal ainda havia um longo período de trabalho naquelas plagas. Estava sozinho mas em paz. O dia havia sido cheio e tenso e tudo o que queria era não pensar, relaxar e desfazer-se da tensão do dia agitado de trabalho.

Pensou em como tinha facilidade em adaptar-se aos lugares e situações e como sua vida tinha mudado recentemente. Nessa mesma época, ano passado, jamais imaginaria-se naquele lugar, tomando esse chocolate quente. Ouviu um celular tocando e lembrou-se que tinha uma ligação a fazer e caso não fosse embora não encontraria a pessoa acordada. Ainda não se acostumara com a diferença dos fusos horários. Pagou o chocolate, agradeceu e saiu.

Durante o caminho gelado, da noite que havia caído, permitiu-se ser tomado pelas recordações e em como o turbilhão em que se envolvera o afastara das pessoas queridas. Apesar de segunda-feira sentiu-se cansado, e pela primeira vez percebeu-se completamente só, sensação desconhecida em anos...

Abriu a porta do prédio, subiu o primeiro conjunto de degraus, o segundo, abriu sua porta, entrou, trancou-a, dirigiu-se para o quarto e deixou-se cair na cama pensando em ligar outro dia, afinal nada iria mudar mesmo. Enquanto isso o sono invadiu-o. Mais um dia se fora.

domingo, janeiro 21, 2007

Presentinho...


Quem nunca teve um domingo a tarde em que a única vontade era ouvir música, pensar baixinho a toa, de bem com o mundo? Escolhendo músicas para combinar com o flash back da memória recente, onde o riso foi largo, as brincadeiras ternas, com direito a pernas entrelaçadas, a cabeça no peito, aconchegados, fazendo planos para a vida futura?

Coisa boa essa! Ter vontade de escrever bobagens de amor, não tão bobagens assim, afinal sinceras, com gostinho de adolescência. Lembrar de como é bom conversar com você (mesmo quando está de mal humor, irritado e vem dar oi -rapidão! - porque também tem saudade) .

Ah, se soubesse como está completamente em mim : "(...) teus pelos, teu gosto, teu rosto, tudo que não me deixa em paz (...)" e que mudaria o mundo para sabê-lo feliz. Tudo bem que quero outro mundo mesmo, então aproveita a deixa e me diz. Por isso "(...) Eu queria ver no escuro do mundo , onde está tudo que você quer, para (...) ' transformar o que não te agrada', (...)ver quais são as cores e as coisas para (...)" aprender você sempre mais.

Então, essa tarde é toda sua (como costumam mesmo ser meus dias): nas músicas, no pensamento e na vontade.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Onde há gente no mundo???


Estou numa lan, ouvindo Miles Davis e em quase "estado de graça", caso não fossem minhas preocupações cotidianas, simples até: como a Minustah no Haiti e as constantes denúncias de prisões arbitrárias e maus tratos aos haitianos; minha mãe, que em decorrência da radioterapia, tem tido sua saúde ainda mais debilitada; e, claro, na minha permanente crise de confiança na humanidade, eu inclusa.

Óbvio que é sobre confiança que quero falar agora...Por que confiar é tão difícil? Como saber se aquilo que se viu acontecendo com o outro de fato não vai "rolar" com você também? Sei que estou cercada por pessoas legítimas nas suas formas de ser e pensar. Mas a humanidade tem sempre um pé enfiado na jaca, e é isso que me destempera, que me faz consultar meus oráculos interiores, falhos inclusive.

Quanto mais se vive, mais sabe-se que chuva molha mesmo, que o fogo queima inevitavelmente e que não se é incólume a essas coisas. Bobagens óbvias camufladas para aqueles que tem super poderes. Como não os tenho, sinto-me frágil e vulnerável, quase ofegante...

Sei que devo ser diferente, que é cansativo ser assim, que isso e aquilo. Mas meu racional está sempre sendo boicotado pela forma como sinto. Meus saltos teimam em manter-me vendo processualmente.

Será que apenas eu sinto-me assim? Todos caminham sem dúvidas, medos, inseguranças? Só eu desconfio da felicidade? Pode ser...mas como disse "meu" grande poeta "... Arre, estou farto de semideuses!
Onde há gente no mundo? "

Então para finalizar esse desabafo em plenos pulmões esbanjo Pessoa
"(...)Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. (...)